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21 fevereiro, 2008

ARIANO E SUA PEDRA


Encontrei outro dia, nessas “naveganças internéticas”, um blog onde se discute bem a boa literatura. Por coincidência, havia um post sobre Ariano Suassuna, mais precisamente sobre O Romance da Pedra do Reino. Como havia acabado de ler o livro, resolvi enviar um comentário. Agora, no mesmo blog (o biscoito fino e a massa), há um novo post sobre o livro. Republiquei meu comentário. E resolvi publicá-lo aqui também. Por que não?

O livro de Ariano Suassuna é uma grande empreitada literária que consumiu doze anos de trabalho do mestre paraibano. Conheci o livro nos anos 1990, mas só agora (2007) pude lê-lo. Vejo muitas qualidades na obra, mas vejo também algumas falhas.
No exemplar que tenho (é novo, lançado no embalo da minisérie), há um comentário de Hermilo Borba Filho que o compara à Divina Comédia. Achei muito, mas muuuuuuuuito exagerado. O comentário de Carlos Lacerda é mais apropriado: Dom Quixote. Afinal, Diniz Quaderna é um personagem quixotesco. E macunaímico também.
O que mais admirei no livro foi a maneira lúdica (de brincadeira mesmo) com que o autor deu tratamento aos gêneros. Misturou a narrativa tradicional às narrativas populares nordestinas com ênfase para estas. Citou à vontade, copiou tudo quanto pôde (seguindo as lições de Mário de Andrade em sua grande rapsódia) com a liberdade máxima a que se permitiu,
viajou e inventou, pintou e bordou. Adorei as ilustrações inseridas ao longo do livro – enriquecem e selam definitivamente o parentesco da narrativa com a tradição do cordel, tão cara ao livro. O resultado é a riqueza do universo popular que aflora a cada página do livro em seu estado mais puro.
E o modo como o humor (popular e escrachado, debochado e desbocado, sutil e irônico...) aparece ao longo da narrativa é realmente um dos pontos altos do livro. Acho o Quaderna um personagem muito bem inventado e, igualmente, muito bem trabalho. Mas...

Mas...
O livro é enfadonho. Ou fica enfadonho. A partir do momento em que Quaderna entra para a sala onde será inquirido pelo Corregedor Joaquim Cabeça-de-Porco (não exatamente "a partir do momento", mas em algum lugar dessa interminável cena), a narrativa se torna enfadonha, cansativa, labiríntica (no mau sentido de sem saída). O inquérito se estende por um tempo interminável, não há uma explicação clara de determinados detalhes, alguns pontos são repetidos à exaustão, há parágrafos-tijolos (a mim assim parecem) completamente dispensáveis para o todo da obra, há incoerências (como pode o relato de Quaderna ser tão detalhado se ele não "presenciou" todos os fatos que relata ao Corregedor - embora o autor coloque na boca do personagem palavras que tentam [mas não conseguem] justificar o modo como Quaderna tomara conhecimento de determinados fatos) geradas pelo foco narrativo adotado por Suassuna, uma primeira pessoa onisciente... Enfim: do meio para o desfecho, achei o livro mal resolvido.
Podem parecer, esses apontamentos, meio superficiais demais, meio empíricos demais. Não gostaria de aprofundar num debate "intelectual", com aqueles "cortes epistemológicos" e repletos de "segundo Bakhtin". É apenas o parecer de um leitor de cama e banheiro.
O começo do Romance da Pedra do Reino é muito bom, num ritmo fantástico. Diniz e sua imodesta narrativa de sua vida lembrou-me o Ponciano de Azeredo Furtado de O Coronel e o Lobisomem. Mas depois o livro se tornou chato e enfadonho. Sei lá, daqui alguns anos talvez o leia novamente e tenha outra impressão. Mas por agora, ele vai ficar de castigo na estante.

Os que se interessarem por ler todo o “debate”, o link é http://www.idelberavelar.com/archives/2008/02/clube_de_leituras_o_romance_da_pedra_do_reino.php . Há coisas muito boas.

Um comentário:

M. Ulisses Adirt disse...

Adorei os comentários... e, assim como quando li o livro, dei mta risada... "Vai ficar de castigo na estante" é ótimo... :-)